No passado mês de junho de 2019 foi aprovado pela Câmara de Lisboa um novo Plano Municipal para a Pessoa em situação de Sem Abrigo (PMSA).
De acordo com os dados mais recentes disponíveis a população sem-abrigo na principal Cidade do País, ronda os 360 indivíduos a que se devem somar os cerca de 2000 cidadãos que recorrem a centros de acolhimento como forma de obter um local de dormida. Um traço que nos deve inquietar e interrogar quando falamos da população que tem nas ruas o seu “lar” é a permanência no tempo destas situações indignas no quadro de uma sociedade que se quer desenvolvida e solidária.
Quinze anos antes deste novo plano, um estudo desenvolvido pela autarquia lisboeta contabilizou 432 cidadãos que tinham nas ruas e avenidas, o seu “local de residência”. Impressiona que, passada década e meia, apenas se tenha reduzido o quantitativo da população sem-abrigo em escassas dezenas de indivíduos. Face a este cenário é tentador encarar a sucessão de Planos destinados a resolver os problemas vividos pela população sem-abrigo, como mais uma esperança fugidia. Ou mais uma ilusão? Ou talvez outro sonho de solidariedade por concretizar? Não aceitar, por um imperativo ético, a continuidade destes trajectos e vivências dramáticas é um primeiro passo para solucionar os problemas.
Deste modo, deveremos olhar para este novo Plano, recentemente aprovado, como uma oportunidade única para mostrarmos, enquanto cidadãos que partilham o mesmo território, laços de solidariedade para com aqueles que se encontram em situação dramática.
Não tenhamos dúvidas a este respeito: o não ter um espaço a que se possa chamar seu representa um lado perturbante da vida urbana. Talvez por este motivo, a experiência de ser sem-abrigo é, por vezes, caracterizada como um processo tridimensional – “sem casa, sem família, sem lugar”.
No fundo, aqueles que percorrem as ruas da grande urbe sem ter um destino na sua jornada, querem sentir que também têm direito a participar na enorme riqueza daquilo a que chamamos “Cidade”. Qualquer Plano para se intitular de “bem-sucedido” terá, então, obrigatoriamente que juntar a uma componente material (habitação), uma componente social e geográfica, traduzida na construção de um autêntico e perene sentido de pertença quer a uma Comunidade, quer ao Território onde se expressam os laços que unem os Cidadãos.
José Lúcio
Licenciado em Geografia e Planeamento Regional, Mestre em Geografia e Planeamento Regional – Gestão do Território e Doutorado no ramo de Geografia e Planeamento Regional, especialidade de Economia e Sociedades, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa (UNL). Professor Auxiliar na FCSH da UNL, no Departamento de Geografia e Planeamento Regional (DGPR) e no Departamento de Estudos Políticos (DEP). Bolseiro da Comissão Fulbright – Portugal no Departamento de Antropologia e Geografia da California State University – Stanislaus. Investigador no Centro Interdisciplinar em Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa – CICS-NOVA. É investigador do Instituto de Dinâmica do Espaço da FCSH da UNL. Co-autor, com José Chilão, do Livro “Mar Calmo Nunca Fez Bom Marinheiro: uma projeção do Atlântico Português para o Século XXI”, editado pela Chiado Books Co-autor, com Filomena Marques, do Livro “Sem-Abrigo em Lisboa: narrativas num tempo de crise”, editado pela Chiado Books Autor, com Filomena Marques do Livro “Policies and Practices supporting Lisbon’s Homeless Population”, editado pela Chiado Books. Áreas de interesse e investigação: pobreza, exclusão social, geoeconomia, geopolítica, geografia económica.