Olho para a Revista CAIS com fascínio desde que me lembro de, pela primeira vez, ter entendido tanto do que estava por detrás do colete encarnado que a vendia pelas ruas. Ou de me questionar sobre movimentos diferentes às primeiras horas da manhã em semáforos que disciplinavam o bulício típico de grandes centros urbanos. Como que se de uma análise sociológica se tratasse, dava comigo a pensar sobre as reações de cada um à aproximação dos vendedores da revista.
Uns fechavam os vidros, outros estugavam o passo, outros abrandavam em desespero pela demora da luz verde que ditaria a guia de fuga, outros ainda desciam vagarosamente o vidro da janela a medo do contacto físico na transação materializada na troca de uma revista por uma moeda. Para uns, isso podia significar um encurta tempos nas longas filas de trânsito a caminho do trabalho. Para outros, o satisfazer de curiosidades sobre, fizesse sol ou trovejasse, a carolice de quem ganhava a vida em lapsos de tempo invariavelmente curtos. Questionei-me vezes infindas sobre o que podia influenciar a compra da revista. E mais ainda sobre o que iria por detrás de cada um dos que a vendiam. Homens, mulheres, jovens, meias-idades, nacionais, estrangeiros. Sempre os mesmos, nos mesmos sítios, nas mesmas alturas do mês, nas mesmas horas do dia. Até que um dia dei comigo a conduzir ao ritmo de um carro que parou não antes, mas depois do semáforo. E a deliciar-me com o aperto de mão, a nota trocada, a partilha de sorrisos. E a partir daí, abriu-se perante mim um maravilhoso mundo novo. Pesquisei, ganhei coragem, aventurei-me, bati à porta 49 da Rua do Vale Formoso de Cima e deparei-me com pessoas cheias de lições de vida em trocas de experiências que, num círculo virtuoso de dar e receber, se preocupavam verdadeiramente umas com as outras.
Ao desbravar a circunstância da Revista CAIS, descobri a Associação CAIS e abri caminho numa realidade até então razoavelmente distante. De então para cá, os coletes já não são encarnados, mas sim de um amarelo pleno de luminosidade capaz de conferir força e dignidade à vida de quem os enverga com orgulho. E de quem, na Associação, em Lisboa e no Porto, dedica os seus dias a capacitar e dignificar pessoas a quem todos devemos o estatuto de cidadãos de pleno direito, também no que à autonomia e ao acesso ao trabalho diz respeito.
Talvez por isso, seja cada vez maior o número de empresas que assumem compromissos a todos os títulos louváveis em relação à CAIS. O Futebol de Rua, a CAIS Recicla, o Reflex, o Prato Cheio, o Fazer pArte, são algumas das iniciativas que têm contribuído para a mudança na vida de pessoas a quem os direitos humanos não podem ser negados. Entendem-no bem todas as pessoas que convidei para participarem nesta edição da Revista CAIS e que, prontamente, responderam à chamada com um sim de boca cheia. A todos o meu maior bem-haja. A escassos seis anos para cumprimento das metas inseridas nos objetivos de desenvolvimento sustentável, cabe-nos a todos nós, cidadãos responsáveis, levarmos por diante o nosso dever em prol de comunidades mais inclusivas. A CAIS cumpre este ano trinta anos de existência. E com eles todo um histórico sobre pessoas a quem a Associação mudou a vida… Para melhor. Saibamos, pois, estar atentos e brindarmos a uma Associação cuja missão reside na nobreza de todos os que dela dependem, nela acreditam e a ela se entregam de alma e coração. E assim, sim, teremos um 2024 e um futuro em cheio.
Parabéns, CAIS!